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segunda-feira, 7 de novembro de 2022

O perigo da distância para e para com a história


 
Há uns anos comprei um livro sobre os julgamentos de Nuremberga. Na nota introdutória ao livro, traduzido, ou seja, uma nota além do que realmente foi escrito pelo autor original, um aviso legal (vulgo, disclaimer), que, linhas travessas, consciencializava as pessoas para a severidade das ocorrências retratadas (o Holocausto) e como a distância que temos para com o acontecimento – 1939 a 1945 -, algo que nos podia colocar desde uma posição distante à alçada do ali retratado (alertando ainda para uma possível janela de endeusamento ao ali protagonizado pelo movimento fascista). Isto é, com o passar dos anos, incorre-se no perigo de que as gravidades possam ser encaradas com leveza e até recicladas como novas correntes. Li esse livro no caminho para a Universidade, dou-lhe uma distância compreendida entre os oito e os dez anos e vejo, à sociedade de hoje, a materialização desse pensamento – logo, vi como necessária essa adenda, introdução.
 
De tantas frases, desde «quem não conhece a história está condenado a repeti-la» a «perde-se a memória, perde-se a história», tantas quais cujo autor se perde ou nem se menciona, vejo as gerações olharem para o passado desde uma postura pouco empática, fria e insensível. O assassino de massas (achei por bem começar esta frase desta forma), Stalin cunhou que «a morte de uma pessoa é uma tragédia; a morte de várias pessoas é uma estatística» e, de tão errado que era, nessas duas frases acertou. Não por ter razão – porque a morte de uma pessoa deve ser sempre intolerável, sempre uma tragédia -, mas por ter simplificado o que hoje pode ser uma dissertação, um ensaio, tema de livro com espessura de portão de ferro, penso em duas conclusões, com ligação e sem ordem, sobre o que aqui toco e não aprofundo:
 
1) Creio que a história deve ser contada sempre, sempre, sempre, na ausência de opinião. A história deve ser informação e nunca opinião e, anteriormente ou posteriormente, deve haver uma consciencialização sobre o que é correto e o que é errado, desde posições incontestáveis (ou seja, com isto escrevo que o que é correto e o que é errado não é algo opinativo e sim fatual), porventura, sugiro, com avisos legais através de formação cívica, reforço, sem cunhos de ideologias ou posições (sejam elas de direita, esquerda ou centro).
 
2) O tempo que passa desde que a história é feita, seja ela positiva ou nociva, abre uma distância para que os acontecimentos se repitam e o clima de intolerância, radicalismo, insensibilidade e extremismo cresça (tal como o inverso disso: tolerância ou sensibilidade para o que é radical ou extremo), num círculo de pensamento sangrento e desinformado que nos condena à involução cultural – de quem pensa, de quem contagia pensamento e influencia (pela informação opinada ou pela opinião), de quem toma decisões geopolíticas, políticas e/ou militares (…) -, e arriscamo-nos a perder humanidade no que a humanidade venceu.
 
Roberto Rivelino - O perigo da distância para e para com a história - 2022/11/07